Café Notre Dame
Uma espécie de trauma sexual
prende um casal abismado
Ele está segurando as duas mãos dela
nas suas
Ela está beijando as mãos dele
Estão olhando-se
nos olhos
de muito perto
Ela tem um casaco de peles
feito duma centena de coelhos correndo
Ele
tem um casaco clássico sombrio
e calças cinza-de-pardo
Agora estão a examinar as palmas
das mãos um do outro
como se fossem mapas de Paris
ou do mundo
como se estivessem à procura do Metrô
que os levasse juntos
através dos caminhos subterrâneos
através das «estações do desejo»
até ao terminal do amor
até às portas da cidade-luz
É um caso sem saída
e estão perdidos
nas linhas cruzadas
das suas palmas enlaçadas
suas linhas de cabeça e linhas de coração
suas linhas de sorte e linhas de vida
ilegíveis e misturadas
no mons veneris
da sua paixão
In “A boca da verdade”, Antologia Portuguesa
Trad. André e Isabelle Lima
1986
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Lawrence Ferlinghetti, nasceu na cidade de Yonkers, Nova York, em 1919. Foi o precursor dos poetas beats americanos e os seus poemas receberam influência de expoentes da poesia contemporânea do século XX, como e.e. cummings, T.S. Eliot, Ezra Pound e, principalmente, William Carlos Williams.
Ferlinghetti utilizou, na sua construção poética, elementos banais do quotidiano, como telefones, assentos de privada, lâminas de barbear e pontas de cigarro, construindo uma visão das ruas, a realidade entrelaçada a uma idéia surrealista no improviso andarilho, elemento tipicamente underground dos poetas dessa geração.
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