sábado, 4 de novembro de 2017

Maria João Cantinho_ No olho da baleia.


Maria João Cantinho

Savana

Se eu te pedisse a demora, pai,

De um corpo adiado, ainda,

e te contasse de novo as viagens

que fazíamos no tempo antigo

e as minhas palavras pudessem

aquecer o teu olhar, trazê-lo de novo

ao meu chão, às minhas mãos,

como as histórias que me contavas

e depois ríamos inteiros.

Se eu te pedisse a demora, pai

para recomeçar a vida, para recompor

a ruína, juntar todos os ossos

para te devolver a luz da savana

e a respiração das árvores, o inexaurível canto

da terra, do rio que havia

e do olhar bravio das gazelas

no fulvo dorso da madrugada.

Se eu te pedisse a demora, pai

para recomeçar tudo de novo,

infância e areia correndo por nós,

só a música e o segredo da savana

o fogo da tribo, a dança

e sempre o tempo

o da fala antiga

o que se anela com deuses

e com o pó.



.......





1 comentário:

  1. Um excelente poema da Maria João Cantinho(?). Só tenho um livro dela.
    Um beijo, meu Amigo.

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